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 Escuta Zé-Ninguém-4

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Torcato
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MensagemAssunto: Escuta Zé-Ninguém-4   Escuta Zé-Ninguém-4 EmptyTer Fev 03, 2009 12:14 pm

Sem dúvida que te agrada possuir “gênios” e render-lhes a devida homenagem. Mas queres um gênio bom, um homem de moderação e decoro, sem fantasia, isto é, um gênio comedido e adaptado, não um gênio rebelde e livre, capaz de quebrar as tuas barreiras e limitações. Queres o gênio limitado, tratável, uma máscara que possas passear sem medo e em triunfo pelas ruas das tuas cidades.
És assim, Zé Ninguém. Bom na acumulação e no dispêndio, mas incapaz de criar. E é por isso que és o que és, toda a vida fechado num escritório solitário ou agarrado ao estirador, preso no colete-de-forças conjugal, ou professor das crianças que odeias. Incapaz de progredir ou de gerar algo de novo, porque és capaz de servir-te do que outros te oferecem em bandeja de prata.
Não entendes porque é assim, porque não pode ser doutra maneira? Eu digo-te, Zé Ninguém, porque eu aprendi a ver-te como o animal rígido que me trazia no seu vazio, na sua impotência, na sua doença mental. Só sabes sorver e apanhar, não sabes criar ou dar, porque a atitude básica do teu corpo é a retenção e o despeito; porque entras em pânico de cada vez que sentes os impulsos primordiais do AMOR e da DÁDIVA. É, por isso que tens medo de dar. A tua permanente avidez só tem um significado: és continuamente forçado a encher-te de dinheiro, de satisfações, de conhecimento, porque te sentes vazio, esfomeado, infeliz, ignorante e temendo a sabedoria. É, por isso que foges da verdade, Zé Ninguém – ela poderia fazer-te amar. Saberias então o que tento, inadequadamente, dizer-te. E isso tu não queres, Zé Ninguém. Só queres que te deixem em paz como consumidor e patriota.
“Ouçam isto! Este tipo nega o patriotismo, a base do Estado e do seu órgão fundamental, a família! Isto não pode ficar assim!”
É assim que gritas “aqui-d'el-rei” quando alguém te denuncia a prisão de ventre mental. Não queres nem ouvir nem saber, queres berrar “vivas”. Mas porque não me deixas dizer-te por que razão és incapaz de alegria? Vejo-te o susto nos olhos - sente-se até que ponto o assunto te afeta profundamente. A “questão religiosa”, por exemplo. Afirmas defender a “tolerância religiosa”; afirmas o teu direito à liberdade em matéria religiosa. Perfeito. Mas queres mais: queres que a tua religião seja a única. És intolerante quanto às outras. Ficas desesperado quando encontras alguém que, em vez de um Deus pessoal, adora a natureza e procura entendê-la. Preferes que os cônjuges em vias de separação se processem judicialmente, se acusem de imoralidade ou de brutalidade quando já não lhes é possível viver juntos. Tu, que és descendente de homens rebeldes, és incapaz de reconhecer o divórcio por mútuo consentimento - porque a tua própria obscenidade te assusta. Queres a verdade num espelho, algures onde não possas chegar-lhe. O teu “chauvinismo” decorre naturalmente da tua rigidez, da tua prisão de ventre mental,
Zé Ninguém. E não o digo com sarcasmo, porque te estimo, embora seja teu hábito esmagar os que te estimam e dizem a verdade.
Repara, por exemplo, nos teus patriotas: não andam, marcham. Nem odeiam o inimigo – o que acontece é que têm “inimigos hereditários” que de dez em dez anos passam à categoria de amigos hereditários, e vice-versa. Não cantam – berram hinos marciais. Não fazem amor – “comem-nas” e têm um curriculum de “fudidas”, por noite. Estas são as verdades que tenho para dizer-te, Zé Ninguém, e contra as quais nada tens a opor, exceto o assassínio, o mesmo que perpetraste contra tantos outros homens que te estimavam: Jesus, Rathenau, Karl Liebknecht, Lincoln e muitos outros. Na Alemanha costumavas chamar-lhe “depuração”. A longo prazo foste tu que foste “depurado” aos milhões – mas continuas a ser um patriota.
Desejas amar e ser amado, amas o teu trabalho e é dele que vives, e a base do teu trabalho é o meu conhecimento e o de outros. O amor, o trabalho e o conhecimento não têm pátria, não conhecem fronteiras nem uniformes. São internacionais, são o patrimônio da humanidade. Só que tu preferes o teu patriotismo medíocre porque tens medo do amor genuíno, do trabalho responsável, medo do conhecimento. E por isso exploras o amor, o trabalho e o conhecimento dos outros, mas nunca poderás criar. Por isso usas a tua alegria como um ladrão furtivo, por isso não consegues suportar sem azedume e inveja a felicidade dos outros.
“Agarra que é ladrão! Não passa dum estrangeiro, dum imigrante. Eu não, eu sou alemão, americano, dinamarquês, norueguês!”
Pára com isso, Zé Ninguém! Tu és e hás-de ser sempre o eterno imigrante e emigrante. Vieste parar a este mundo por acidente e hás-de deixá-lo sem que ninguém dê por isso. Berras porque tens medo. A pouco e pouco, o teu corpo devém rígido e seco. É por isso que tens medo e chamas a polícia. Mas tão-pouco a tua polícia tem poder sobre a verdade. Mesmo o teu polícia se me vem queixar da mulher e dos filhos doentes. Quando se pavoneia de uniforme lá vai escondendo o homem; mas não de mim, que já o vi nu.
“O tipo tem registro criminal? Tem os papéis em ordem? Pagou os impostos? Passem-lhe uma busca. O homem é uma ameaça ao Estado e à honra da Nação!”
Por acaso, Zé Ninguém, sempre foi possível identificar-me, sempre tive os papéis em ordem e paguei os impostos. O que te rala não é o estado do Estado ou a honra da Nação. Tens é medo que eu exponha em público o que de ti fui conhecendo no consultório médico. É por isso que tentas inventar-me um crime político que me meta na cadeia durante anos. Eu conheço-te, Zé Ninguém. Se por acaso és juiz de comarca estás muito menos interessado em proteger a lei ou os cidadãos do que em fazer vista com o “caso” que te há-de levar a juiz de primeira instância. Ao Sócrates aconteceu-lhe o mesmo. Mas a história nunca te ensinou o que quer que fosse. Assassinaste Sócrates, e como não sabes o que fizeste, continuas na lama. Acusaste-o de perverter o teu código moral. Mas ele continua a fazê-lo, Zé Ninguém – assassinaste-lhe o corpo, não o espírito. E continuas a assassinar, em nome da “ordem”, mas covardemente, pelas costas. És incapaz de me encarar quando me acusas de imoralidade. -Porque sabes bem qual de nós é imoral, obsceno e pornográfico. Alguém afirmou uma vez que de toda a gente que conhecia só havia um que não contava piadas porcas – era eu. Quanto a ti, quer sejas juiz ou chefe da policia, conheço -as tuas piadas porcas e sei de onde vêm, de modo que é melhor não abrires a boca. Talvez consigas provar que paguei cem dólares a menos de impostos, ou que atravessei a fronteira entre dois estados com uma mulher, ou que parei para falar com uma criança na rua. Mas é na -tua boca que qualquer destes fatos assume o caráter equivoco e reles de um ato vil. E,como não sabes mais nada, pensas que eu sou da tua espécie. Não, Zé Ninguém, não sou, e nunca fui como tu nessas matérias. E tanto me faz que acredites ou não, embora tu detenhas a força e eu o conhecimento – são funções diversas.
É assim que dás cabo da tua existência: em 1924 sugeri um estudo científico da natureza humana. Reagiste entusiasticamente.
Em 1928, o nosso trabalho apresentava os primeiros resultados tangíveis – continuaste entusiástico e eu tive honras de spiritus rector.
Em 1933, os resultados em questão deveriam ser publicados pela tua casa editora. Hitler acabara de subir ao Poder. Eu acabara de entender que a subida de Hitler ao Poder estava ligada à tua rigidez de atitudes. Recusaste-te então a publicar o livro que te demonstrava como havias produzido Hitler.
O livro, no entanto, foi publicado e continuaste entusiástico. Só que tentaste abafá-lo no silêncio, pois que o teu “Presidente” se tinha declarado publicamente contra ele.
Tinha, aliás, também aconselhado às mães a que suprimissem a excitação genital das crianças sustendo-lhes a respiração.
Durante doze anos mantiveste-te silencioso sobre o livro que tinha suscitado o teu entusiasmo. Em 1946 foi reeditado e aclamaste-o então como “um clássico”. Ainda hoje parece entusiasmar-te.
Passaram-se, entretanto, vinte e dois longos anos, carregados de ansiedades e trabalhos, desde que comecei a transmitir-te que mais importante que o tratamento individual é a prevenção da perturbação mental. Durante vinte e dois anos te afirmei que as pessoas caem nesta ou naquela forma frenética de existir ou se enterram em lamentações estéreis porque lhes são impossíveis o amor e o prazer. Porque os seus corpos, ao inverso do que acontece nas outras espécies animais, não mais possuem a capacidade de contrair-se e expandir-se no ato do amor.
Vinte e dois anos depois de eu o ter afirmado, di-lo tu agora aos teus amigos: mais.importa a prevenção das perturbações mentais do que o seu tratamento individual. E de novo ages como o tens feito há milhares de anos: falas dos grandes objetivos sem te preocupares com a forma de os alcançar. Esqueces a dimensão afetiva da vida das massas. Preconizas a “prevenção das perturbações mentais”, aspiração inócua e muito digna. Mas julgas ser possível fazê-lo ignorando a prevalência generalizada da frustração no domínio sexual. Nem sequer consentes que se fale nisso. E assim, também como médico não tens saída.
Que pensarias tu de um técnico que revelaste a técnica de vôo e guardasse como secretas as características do motor e da hélice? É assim que funcionas como técnico de psicoterapia – covardemente. Aceitas o que das minhas Idéias te convém, mas rejeitas-lhe os espinhos. Vais-me chamando, cheio de subentendidos pornográficos, “o profeta do bom orgasmo”.Ouve, psiquiatrazinho, nunca te impressionaram as queixas de mulheres recém-casadas, com o corpo violado por maridos impotentes? Ou a angústia dos adolescentes que sofrem de amor insaciado? Será que tens em maior conta a tua segurança que a dos teus doentes? Até quando
irás preferir a tua dignidade medíocre à tua responsabilidade terapêutica? Durante quanto tempo mais serás capaz de escamotear o fato de que as tuas táticas sacrificam milhões de vidas?
A segurança é-te mais importante que a verdade. A primeira vez que ouviste falar do orgone, descoberta minha, não foste capaz de te interrogar quanto à sua utilidade, às suas possibilidades de aplicação terapêutica, mas sim se eu possuía ou não documentação que me permitisse praticar a medicina no estado do Maine. Nem entendes que as tuas exigências burocráticas, se pouco ou nada perturbam o meu trabalho, ainda menos o impedem. Será que nem sequer tens consciência do meu prestígio como investigador, da ligação do meu nome à descoberta da peste emocional e da energia vital - que ninguém menos qualificado que eu poderá examinar-me?
Vejamos quanto à tua avidez de liberdade. Nunca ninguém te perguntou porque sempre te foi impossível alcançá-la ou por que razão, se alguma vez o conseguiste, imediatamente a depositaste nas mãos de novos amos.
“Ouçam isto! Este monstro atreve-se a duvidar do levantamento revolucionário dos proletários de todo o mundo, atreve-se a duvidar da democracia! Abaixo a contra-revolução! Fora com ele!”
Não te excites, chefezinho de todos os democratas e de todos os proletários do mundo. É, minha firme convicção de que a tua futura liberdade real depende mais da tua resposta a esta pergunta do que de milhares de resoluções dos teus congressos de Partido.
“Fora com ele! Corrompe a honra da nação e a vanguarda do proletariado revolucionário! Fora! Rua! Encostem-no à parede!”
Mas não são os teus “vivas” e os teus “morras” que te irão aproximar dos teus objetivos, Zé Ninguém. Sempre acreditaste que a tua liberdade se acha assegurada através da perseguição dos opositores. Ao menos uma vez na vida encara-te de frente.
“Fora! Fora!”
Pára. um minuto, Zé Ninguém. Não é minha intenção menosprezar-te, mas apenas provar-te por que razão até agora te não foi possível alcançar a liberdade ou garanti-la. Será que o tema não te interessa?
“Fora! Fora!”
Posso garantir-te que vou ser breve: tentarei, dizer-te como se comporta o Zé Ninguém cada vez que se acha numa situação de liberdade. Suponhamos que és estudante num Instituto que, entre outros, defende os, valores da saúde sexual das crianças e dos adolescentes. A “extraordinária idéia” entusiasma-te, de modo que desejas participar na luta. Vou contar-te o que aconteceu na minha escola: os meus alunos estavam sentados ao microscópio a observar microrganismos. Tu estavas sentado no acumulador de orgone, nu. Chamei-te para que participasses da observação. Foi então que decidiste sair tal como estavas do acumulador, exibindo-te diante das raparigas e das mulheres. Admoestei-te imediatamente, mas não pareceste entender porque o fazia. Parecia-me inverossímil que o não entendesses. Mais tarde, em longa conversa, admitiste que na base do teu comportamento estava exatamente a imagem que tinhas dum Instituto que defendia a liberdade sexual. Tomaste então consciência do fato de que tinhas o maior desprezo pelo Instituto e pela sua idéia de base e que havia sido por isso que te tinhas comportado indecentemente.
Um outro exemplo que demonstra a forma como destróis a tua liberdade: tu sabes e eu sei e todos, sabemos que vives num estado de permanente frustração sexual; que facilmente encaras com avidez qualquer membro do outro sexo; que as conversas que tens com os amigos sobre temas sexuais se resumem ao repertório de anedotas obscenas; que, em suma, a tua imaginação é, sobretudo, pornográfica. Uma noite ouvi-te passar berrando com os teus amigos pela rua fora:
“Nós queremos mulheres! Nós queremos mulheres!”
Dado que o teu futuro faz parte das minhas preocupações, tentei criar instituições onde pudesses compreender melhor a tua miséria e modificá-la. Tu e os teus amigos vieram, em magotes a reuniões que organizei no âmbito dessas instituições. E sabes porque foi assim, Zé Ninguém? Ao início cheguei a pensar que te movia um genuíno interesse, a vontade de dares novo sentido à tua vida. Só mais tarde entendi o que realmente te motivara. Pensavas que irias encontrar uma nova forma de bordel, onde seria fácil encontrar uma rapariga sem gastar um tostão. E quando o entendi, destruí por minhas próprias mãos as instituições que criara tentando ajudar-te.
Não porque me pareça que haja algo de errado no fato de poderes encontrar uma rapariga nessas reuniões, mas porque a intenção com que vinhas a essas reuniões era vil. Por isso as destruí, por isso mais uma vez ficaste onde estavas... Tens alguma coisa a dizer?
“O proletariado foi corrompido pela burguesia. Os líderes. do proletariado são quem poderá solucionar o problema. Irão sanear os costumes com um punho de ferro – o problema sexual do proletariado só assim poderá ser solucionado”.
Eu sei o que tu queres dizer, Zé Ninguém. Foi exatamente o que se passou na tua pátria dos proletários: deixar que o problema sexual se resolvesse por si próprio. O resultado viu-se em Berlim, com os soldados proletários violando mulheres a torto e a direito. Sabes que foi assim. Os teus campeões da “honra revolucionária”, “os soldados do proletariado do mundo” prometeram-te o suficiente para a vergonha te durar uns séculos. Dizes que estas coisas “só acontecem na guerra”?

Então conto-te uma outra história:
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